sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Transbordamento: antes de aumentar as secções das calhas, amplie a capacidade dos condutores verticais

por Engº Ms. Sérgio Frederico Gnipper

Transbordamento: antes de aumentar as secções das calhas, amplie a capacidade dos condutores verticais



Não é raro ocorrer transbordamento de calhas em forros e lajes de teto quando
 ocorrem chuvas intensas. Conforme a intensidade e a duração da chuva, a água extravasada
 para dentro do ambiente pode representar sérios prejuízos e aborrecimentos para os seus 
usuários. Mas nem sempre o problema está na capacidade das calhas em si, mas nos condutores 
que estão com pouca capacidade.
Na figura abaixo vemos alguns exemplos de calhas de platibanda com seção retangular
 e semi-circular. Elas são dimensionadas para determinada quantidade de chuva por m², 
para isto determina-se qual é a área de contribuição do telhado, sabendo-se assim quantos 
litros por minuto serão escoados em cada parte da calha. Com o tempo e as variações climáticas,
 pode acontecer que dada calha passa a receber quantidade de água maior do que aquela 
de início prevista.

Exemplos de calha de platibanda


A figura abaixo ilustra uma situação onde uma calha teve suas dimensões originalmente
 calculadas para captar e conduzir apenas a água que incide no pano de telhado
 em cujo beiral está fixada. Porém, a construção posterior de edificações vizinhas
de maior altura, com expressivas superfícies verticais (A1 e A2), anexas ao pano 
do telhado inicial, acabaram aumentando a área de interceptação de chuvas 
que contribuem para a calha.

Contribuição dos edifícios vizinhos no aumento de vazão de uma calha


Neste caso, sempre que incide uma chuva intensa, acompanhada de vento na direção
 da concavidade formada por essas três superfícies contíguas, as superfícies verticais
 interceptarão águas de chuva que também serão direcionadas para a calha. Como ela 
foi originalmente dimensionada para apenas dar conta da chuva que incide sobre o pano
 de telhado, certamente transbordará sempre que ocorra uma chuva mais intensa, 
permitindo que um bom volume de água penetre por sobre o forro ou laje de teto.

Para corrigir o problema logo se pensa em algo radical: troca da calhas existentes por outras
 com maior seção, o que nem sempre é viável ou fácil de ser feito no local, por vezes requerendo
 modificações no madeiramento sob as telhas, com elevado custo e dificuldade de execução.
 Em situações como esta, antes de cogitar trocar a calha, um profissional especializado poderá
 propor medidas práticas para aumentar a capacidade de vazão do sistema predial de coleta
 de águas pluviais, com base em cálculos de engenharia e soluções provenientes do
 conhecimento técnico do funcionamento do sistema.

Entre essas medidas, estão:
• O simples aumento da declividade das calhas (sua inclinação), e
• O aumento da capacidade de escoamento dos condutores verticais. Vejamos:

1 -- Aumento da declividade das calhas
Esta primeira medida deve ser tomada sempre que possível, porém sabendo de antemão que
 tem suas limitações. Quando uma chuva intensa passa a incidir sobre uma dada superfície 
na cobertura de uma edificação, a máxima vazão de contribuição na respectiva calha só 
ocorre depois de um certo intervalo de tempo, chamado tempo de concentração, 
decorrido o qual toda a superfície do pano do telhado passa a contribuir para a 
respectiva calha.

A contribuição máxima de uma chuva na calha só se dá quando decorrido o tempo de concentração
Acompanhe pela figura ao lado. A contribuição máxima de uma chuva na calha só se
 dá depois de decorrido o tempo de concentração das águas. Depois que essa condição
 se estabelece, pode-se considerar que a vazão é proporcional à raiz quadrada da declividade 
da calha. Dessa forma, ao se duplicar o valor da declividade da calha, a vazão máxima por ela
 conduzida teoricamente aumentará apenas 41%.

Porém, na prática, esse valor é bem menor, pois fica condicionado a outros fatores limitantes 
tais como a condição hidráulica da inserção da água no condutor vertical (interação 
calha-condutor) e distância da tomada de água do condutor ao início ou mudança de direção
 da calha. A figura abaixo mostra como a lâmina d'água demora a levar a capacidade da calha
 ao seu limite, só ocorrendo após certo período de tempo:

Lâmina d'agua escoando para calha

Outro fator que diminui a eficiência da calha é a mudança de direção na calha.
 a redução na capacidade de escoamento chega a ser 17%, dependendo da suavidade 
da curva e de sua distância em planta à entrada para o condutor vertical, 
conforme mostra a tabela abaixo:

Lâmina d'agua escoando para calha
Redução da capacidade de escoamento da calha
Tipo de curvaDistância da curva à saída
d < 2 m2m ≤ d ≤ 4m
Canto vivo17%9%
Canto arredondado9%5%


2 -- Aumento da capacidade de escoamento do condutor vertical
Como nem sempre o aumento da inclinação da calha é fisicamente viável sem grandes
 intervenções nos elementos construtivos em que se apóia, resta o aumento da capacidade 
de escoamento do condutor vertical, que poderá promover uma redução na máxima altura
 da lâmina d’água dentro da calha.

Esta possibilidade está ligada ao fato da altura máxima da lâmina d’água dentro da calha
 depender da maior ou menor facilidade de inserção no condutor vertical, determinante
 de sua capacidade de escoamento, que pode ser aumentada mediante as seguintes ações,
 entre outras:
• Adoção de funil e/ou de ralo hemisférico na embocadura do condutor vertical ao fundo
 da calha;
• Adoção de bandeja pluvial;
• Supressão ou distanciamento de eventual desvio de verticalidade no condutor vertical 
em relação ao fundo da calha.

2.1 -- Adoção de funil de saída na tomada d’água do condutor vertical
Embocadura do condutor vertical em canto vivo
Quando um condutor vertical transporta água pluvial proveniente de calha
 de beiral ou de platibanda, a tomada d’água (ou embocadura) geralmente é feita 
em canto vivo, ou seja, com a formação de uma aresta circular ou retangular no 
fundo da calha, tendo o condutor vertical uma seção uniforme ao longo do seu desenvolvimento,
 ou seja, seção constante, conforme mostra a figura ao lado.
Essa aresta cria certa dificuldade para a entrada da água da calha para o interior do
 condutor vertical, pois o escoamento horizontal na calha, dito em regime de canal, 
transita para outra forma de escoamento dentro do condutor vertical, conhecido como
 regime anelar, aderente às paredes internas da tubulação.
Dentro do condutor vertical, o fluxo de água arrasta consigo ar atmosférico por atrito, 
cuja entrada é estrangulada na embocadura ao fundo da calha, particularmente quando 
existe aresta viva. Quanto maior for a vazão de água pluvial, maior será a espessura do 
anel líquido descendo dentro do condutor vertical, e maior a quantidade de ar arrastado
 para o seu núcleo.

O ar ocupa espaço dentro do condutor vertical que poderia estar sendo utilizado para o 
escoamento de água pluvial. Portanto, sua presença acaba reduzindo a capacidade de 
escoamento do condutor vertical e, por conseguinte, de esgotamento da calha.

A entrada de ar atmosférico dentro do condutor vertical por arraste ou aspiração depende da
 geometria da sua tomada d’água. A existência de aresta ou canto vivo na embocadura do
 condutor vertical serve de vertedor radial para a água proveniente da calha.

Estrangulamento da entrada de ar com o aumento da vazão de água pluvial e formação de vórtice hidráulico

A figura acima mostra o strangulamento da entrada de ar com o aumento da vazão
 de água pluvial e formação de vórtice hidráulico. Havendo elevação da vazão de água 
na embocadura há também aumento na velocidade do escoamento horizontal na calha e 
conseqüente estrangulamento parcial na entrada do ar atmosférico que é arrastado por 
atrito pelo fluxo líquido dentro do condutor vertical.

Quando a vazão de água na calha aumenta de forma expressiva, pode dar origem ao
 fenômeno da formação do vórtice hidráulico, também chamado turbilhão, remoinho ou 
redemoinho. Sempre que isto ocorre, há uma aspiração ainda maior de ar para dentro do 
condutor vertical, limitando a sua capacidade de escoamento líquido. Isto acontece porque 
o estrangulamento da entrada de ar proporcionado pela aresta viva faz com que este adquira
 pressão inferior à atmosférica dentro do condutor vertical.

Uma forma de evitar que o ar ocupe espaço significativo dentro do condutor vertical, permitindo
 que este escoe uma maior vazão de água pluvial, está na adoção de uma redução gradual da 
seção da embocadura do condutor vertical. Isto é proporcionado pela interposição de um funil
 de saída, reduzindo muito o efeito desfavorável da aresta viva no fundo da calha, conforme a 
figura abaixo:

: Embocadura do condutor vertical com funil de saída











Esta disposição geométrica reduz o efeito do canto vivo atuando como vertedor radial,
 pois, ao nível do fundo da calha o seu diâmetro aumenta significativamente, evitando aí 
o estrangulamento na entrada do ar. Com isto, o transfere de forma mais atenuada para o
 fundo do funil, em cota já inferior à do fundo da calha, desvinculando parcialmente o
 escoamento horizontal do vertical.

Como a tomada d’água do condutor vertical no fundo da calha é um local onde ocorre 
acentuada perda de carga (perda da energia presente em cada unidade de massa da água),
 com transição do regime de escoamento, a formação de uma certa altura de lâmina d’água 
no interior da calha, constituindo certa carga hidráulica, é necessária para vencer essa perda 
de carga.

A presença do funil de saída concorre para a redução da altura de lâmina d’água requerida no 
interior da calha, com conseqüente aumento na capacidade de escoamento do conjunto 
calha-condutor vertical, pois reduz a perda de carga da água na entrada do condutor vertical.

Tem sido costumeira a adoção de funil com extensão e embocadura com o dobro do diâmetro 
do condutor vertical, mas essas dimensões devem ser, ao menos, superiores a 4/3 desse 
diâmetro. A tomada d’água em funil de saída também contribui para dificultar a formação de
 vórtice hidráulico na entrada do condutor vertical, mas, para isso, sua posição relativa no 
fundo da calha é de fundamental importância. A distância da aresta do funil, na linha de 
encontro com a calha, até sua borda lateral, ou de fundo, quando o condutor vertical 
estiver alojado numa de suas extremidades, não deve ser maior do que certas proporções,
 para que não haja formação de vórtice hidráulico.

Já em calhas de beiral ou de platibanda com tomada d’água do condutor vertical 
em aresta viva, 
desprovida de funil, a distância da aresta até a borda da calha, ou sua extremidade,
 não deve ultrapassar o valor da dimensão correspondente do condutor para se evitar
 o vórtice.

: Tubo prolongador em lugar de funil cônico convencional
Dessa forma, para que não ocorra o vórtice hidráulico, a
 tomada d’água do condutor vertical no fundo da calha deve situar-se
 o mais próximo possível de uma de suas bordas. Quando essa condição 
não for viável, então a tomada d’água deverá ser provida de ralo hemisférico,
 que garante admissão radial de água ao topo do condutor vertical.

Na figura ao lado, vemos uma interessante alternativa ao funil cônico ou 
tronco-piramidal convencional, com resultados assemelhados, é a adoção
 de tomada d’água ao fundo da calha com um trecho vertical de tamanho
 bem superior ao requerido para o restante do condutor vertical. 
Na vida prática esse trecho vertical inicial é conhecido por tubo prolongador.
Para se determinar, caso a caso, o quanto a introdução de um funil de saída
 na embocadura de um condutor vertical acresce em termos de vazão a capacidade
 de escoamento do conjunto calha-condutor, pode-se empregar os gráficos
 experimentais presentes na NBR 10844:1989 (“Instalações prediais de águas pluviais”),
 válidos para condutores verticais com tubulação rugosa dotada de duas curvas ao longo 
de sua prumada.

2.2 -- Adoção de grelha e/ou ralo hemisférico
Ralos hemisféricos são elementos de captação tubulares cilíndricos dotados de grelha 
hemisférica na parte superior, geralmente metálica ou plástica, posicionada 
ao fundo da calha, na embocadura do condutor vertical, dotado ou não de funil de saída. 

Instalação de grelha hemisférica na tomada d’água de condutor vertical ao fundo da calha









A figura acima mostra a instalação de grelha hemisférica na tomada
 d’água de condutor vertical ao fundo da calha. Os ralos hemisféricos costumam
 ser adotados em locais onde os ralos planos podem sofrer obstruções, por exemplo, 
pelo acúmulo de folhas de vegetação ou detritos, dado o formato característico da grelha,
 que permite a retenção desse material em sua porção inferior, e a passagem da 
água por cima, ao formar certa altura de lâmina líquida. Dessa forma, uma aplicação muito 
útil para o ralo hemisférico é sua adoção em calhas sujeitas à deposição de folhas
de vegetação. Entretanto, a maior vantagem e principal razão para sua aplicação em
 situações específicas de projeto, estão no fato da grelha hemisférica, situada na embocadura 
de um condutor vertical ao fundo da calha, admitir água em seu interior de modo 
predominantemente radial, decorrente da forma peculiar das aberturas ou ranhuras de sua grelha. 

Admissão radial de água em ralo hemisférico e em grelha hemisférica

A figura acima mostra a admissão radial de água em ralo hemisférico
 e em grelha hemisférica. Esta admissão predominantemente radial da água 
evita a formação do vórtice hidráulico (turbilhão ou redemoinho) quando a
 lâmina d’água sobre o ralo atinge determinada altura que permite arraste de ar,
 que, conforme visto, acaba ocupando lugar da massa líquida no interior das tubulações 
e reduzindo sua capacidade de transporte.

O vórtice hidráulico favorece a admissão de ar dentro do condutor vertical
A figura ao lado mostra como o vórtice hidráulico favorece
 a admissão de ar dentro do condutor vertical. Em conseqüência,
 um dos recursos para se aumentar a capacidade de escoamento
 de um condutor vertical, fazendo-o escoar mais água e menos ar, 
está justamente na sobreposição de uma grelha hemisférica em sua 
embocadura junto ao fundo da calha, de modo a evitar o vórtice e, 
com isso, o excessivo arraste de ar para dentro do condutor vertical.

Neste caso, como a presença da grelha hemisférica impõe certa resistência
 ao escoamento, ou seja, uma perda de carga localizada, impondo a elevação
 da altura da lâmina líquida dentro da calha. Isto poderá compensado adotando-se
grelha hemisférica com diâmetro superior ao do condutor vertical, ou seja,
 com área de frestas (ranhuras) superior à área da seção do condutor.

2.3 -- Adoção de bandeja pluvial na embocadura do condutor vertical
Bandejas pluviais são elementos de acumulação temporária de água, destinados
a receberem águas pluviais de calhas por deságüe livre (queda livre), e
mediante elevação da carga líquida em seu interior, conduzi-las adequadamente 
a um condutor vertical.

: Bandeja pluvial dotada de grelha hemisférica e condutor vertical com tubo prolongador


A figura acima mostra uma bandeja pluvial dotada de grelha hemisférica e
 condutor vertical com tubo prolongador. A bandeja, portanto, sempre se situa
 na extremidade superior de um condutor vertical e propicia a elevação da lâmina
 líquida em seu interior para vencer a perda de carga que ocorre na embocadura
 do condutor vertical, substituindo com vantagens o funil de saída. 

Neste caso a água pluvial escoando na calha é despejada livremente por uma extremidade 
lateral, e deságua livremente sobre uma bandeja pluviais, reduzindo o risco de transbordamento
 e aumentando sua eficiência, sem qualquer interferência da embocadura do condutor vertical,
com canto vivo ou com funil de saída. 

Portanto, a principal conseqüência favorável na adoção da bandeja pluvial é 
a desvinculação entre a altura da lâmina d’água presente no interior da calha e 
o diâmetro necessário para o condutor vertical. Dessa forma, a introdução de uma bandeja 
pluvial no topo de um condutor vertical propicia a elevação da capacidade de vazão da calha 
associada. Para um bom funcionamento, as bandejas pluviais devem apresentar: 

Elementos geométricos para o dimensionamento da bandeja pluvial
• Largura igual ou superior à da calha mais larga que nela descarregue
• Comprimento suficiente para receber todo o fluxo da calha, cuja extremidade deságüe na bandeja como um vertedouro livre
• Bordo livre mínimo equivalente a 2/3 da carga hidráulica (profundidade de lâmina) sobre a embocadura do condutor vertical.

O dimensionamento correto de uma bandeja pluvial depende de cálculos de engenharia a partir de formulação empírica obtida em experimentação de laboratório. A figura ao lado, entretanto, dá algumas dicas dos elementos geométricos para o dimensionamento da bandeja pluvial

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